Folha de São Paulo, 21 de Janeiro de 2000

Fiel Transcrição:

Confusão em vôo envolve filho de FHC

 
O comerciante Fernando Cabral com a mulher, Maria de Fátima, os filhos e dois sobrinhos no hotel

AVIAÇÃO Passageiros acham que Varig tentava beneficiar filho de presidente e se recusam a desembarcar de avião

JOÃO CARLOS SILVA MARCELO OLIVEIRA da Reportagem Local

O cancelamento de um vôo da Varig que faria anteontem o trecho São Paulo-Nova York causou uma confusão que se arrastou por pelo menos quatro horas no Aeroporto Internacional de Guarulhos e envolveu bate-boca, o nome do filho do presidente Fernando Henrique Cardoso, Paulo Henrique, e até a Polícia Federal.

A confusão acabou provocando o cancelamento de dois vôos da empresa —para Nova York e Paris. Dos 504 passageiros dos dois vôos, 387 tiveram de voltar para casa ou se hospedar em hotéis pagos pela companhia aérea.

O embarque deles só ocorreu ontem, por volta das 16h30.

Tudo começou com uma pane em uma aeronave da Varig que faria o vôo 720, Porto Alegre-São Paulo-Paris. O avião, que nem chegou a deixar a capital gaúcha, tinha escala em São Paulo, de onde seguiria viagem levando 276 pessoas à capital francesa.

Com a pane, a Varig decidiu usar outra aeronave que vinha do Rio —cumprindo o vôo 864, Rio-São Paulo-Nova York— para substituir, a partir de São Paulo, o avião com problema.

Os passageiros para Nova York seriam acomodados nos lugares disponíveis em vôos de outras empresas ou teriam de embarcar no dia seguinte.

O filho do presidente Fernando Henrique vinha do Rio, na primeira classe do vôo 864, mas faria conexão em São Paulo para o 720, com destino a Paris.

Tinha como companheira de viagem a viúva do compositor Antônio Carlos Jobim, Ana Jobim, que seguiria na mesma aeronave para Nova York.

Durante a viagem, começou a correr entre os passageiros o boato de que o avião não seguiria para os EUA, como estava previsto. A confirmação do cancelamento, porém, só ocorreu na chegada a Cumbica, às 23h45.

Após o pouso, os 81 passageiros que iriam para os EUA foram avisados pela tripulação de que teriam de desembarcar devido a "problemas técnicos" no avião. Os outros

 passageiros com destinos diferentes, como o filho de FHC, já haviam desembarcado.

Irritados, os passageiros se recusaram a descer. No bate-boca com a tripulação, alguns acusavam a empresa de ter tomado a decisão que privilegiava o vôo de Paris para favorecer o filho de Fernando Henrique.

A Varig não havia comunicado oficialmente a troca de aviões, mas a presença de Paulo Henrique despertou a suspeita de que a mudança visava beneficiá-lo.

"Antes do anúncio sobre o problema técnico da aeronave, uma passageira já sabia que o vôo não seguiria para Nova York . Ficou claro que aquilo era mentira, e tinha a história sobre o filho do presidente", disse Cristina Alcântara, 39, uma das passageiras que estava no avião naquele momento.

A confusão só terminou por volta das 4h, com a interferência da Polícia Federal, que agiu como mediadora do conflito.

Quando os passageiros aceitaram deixar a aeronave, já não havia tempo para o vôo seguir para nenhum dos destinos.

Varig e governo

Paulo Henrique, que não foi encontrado para comentar a confusão, foi um dos passageiros que embarcaram ontem à tarde.

Instado a se pronunciar sobre o caso, o Palácio do Planalto distribuiu uma copia da nota oficial divulgada pela Varig.

Nela, a empresa diz que sua decisão de cancelar o 864 foi "estritamente operacional", porque era mais fácil acomodar passageiros com destino a Nova York em vôos de outras empresas.

Anteontem, havia três companhias operando para Nova York, além da própria Varig. No total, 100 dos 228 passageiros para os EUA acabaram viajando na mesma noite. Os outros 128 embarcaram ontem à tarde.

A nota informa que a Varig só conseguiu obter lugar para 17 dos 276 passageiros de Paris. Eles viajaram no único vôo existente naquele dia, além do da Varig, que foi cancelado. Os demais também embarcaram ontem.

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