Jornal do Brasil: 27 de Março de 1989

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Georges Sellinas denuncia superintendente da Polícia Federal de São Paulo

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A denúncia de Georges Sellinas não é a primeira que compromete a Polícia Federal.

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Veronezzi garante que vai abrir inquérito.

Foto: Zaca Feitosa e

Foto: Ariovaldo Santos - 13.2.86

SÃO PAULO — "O superintendente da Policia Federal em São Paulo protege contrabandistas." A denúncia, do engenheiro industrial Georges Sellinas, é o exemplo mais acabado das surpreendentes situações que surgem quando azedam as relações promíscuas entre a policia e seus colaboradores ou informantes. Sellinas. um antigo "informante da Policia Federal", segundo sua própria definição, acusa o superintendente do Departamento de Policia Federal em São Paulo, Marco Antônio Veronezzi, com base numa fita cassete na qual está gravada uma conversa telefônica entre o delegado e um contrabandista.

Essa acusação do grego naturalizado brasileiro Georges Sellinas, há 15 anos proprietário de uma empresa de proteção de segredos industriais e militante voluntário do ramo de informações policiais há quase uma década, coloca em dúvida tanto a segurança dos telefones da Policia Federal quanto a honestidade de seu atual superintendente em São Paulo. A fita, resultado de uma escuta clandestina (o popular grampo) no telefone do gabinete da Superintendência da Policia Federal. resume-se num pedido de Celso, o contrabandista, para retirada de um grupo de policiais federais da empresa Transdata, na qual se realiza, no momento da ligação, uma fiscalização conjunta com a Receita Federal sobre contrabando.

A certa altura do diálogo. Veronezzi diz que "se for só da policia não vai ter problema", acrescentando: "Mas se a Receita estiver junto eu não vou ter como tirar eles de lá". A conversa termina com Veronezzi comprometendo-se a averiguar a situação e com Celso dizendo que voltará a ligar .

Os personagens desse enredo são, além de Veronezzi, que ouviu a fita na semana passada e se lembrou dessa conversa mas não se recorda exatamente quando ela aconteceu, o delegado Armando Panichi Filho, na época lotado no gabinete do DPF em São Paulo e primeiro e falar com o contrabandista. e o ex-agente policial Celso Cipriano, que revela na fita ser o encarregado de providenciar material contrabandeado para a Transdata, empresa de processamento de dados da Transbrasil cujos telefone e endereço são citados durante o diálogo. Celso foi funcionário da Transbrasil, mora nos Estados Unidos e costuma vir ao Brasil de 15 em 15 dias. A Transdata deixou de existir e foi incorporada pela Transbrasil em setembro do ano passado.

Para sustentar uma outra denúncia, Sellinas, que se celebrizou no ano passado por denunciar o suborno de l milhão, de dólares a delegados da Policia Federal no caso do Banco do Estado de São Paulo (Banespa) e reivindica a descoberta de boa parte das fraudes do INAMPS, cita uma Investigação Policial Preliminar (IPP) que teria sido aberta e arquivada por Veronezzi apenas para forçar a empresa Resegue, produtora de óleo comestível, a pagar uma divida ao Banco Nacional. Chamados a depor no IPP n° 120012-87, os responsáveis pela empresa, atemorizados, pagaram a divida de 5 milhões de dólares, em prejuízo de outros credores, de acordo com a denúncia, pois a Resegue era concordatária. 

Há uma terceira acusação, baseada em  documentos sobre a apreensão de 24 mil dólares no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, com liberação do passageiro por ordem do superintendente. Neste caso, a Policia Federal deixou de realizar um flagrante numa situação de evasão de divisas. Estas duas últimas denúncias e outras acusações a Veronezzi foram relatadas por Sellinas numa carta ao Ministério da Justiça. Justificadas pelo DPF, foram arquivadas por despacho do ministro José Fernando Eichemberg, secretário-geral no tempo de Paulo Brossard em exercido na época. O inquérito sobre os dólares ainda não foi concluído, afirma Veronezzi.

Tudo isso é um pacote preparado por Sellinas contra Veronezzi desde que estourou o caso de suborno, dentro da investigação sobre o escândalo financeiro no Banespa durante a presidência do amigo do governador Orestes Quêrcia, Otávio Ceccato. O começo deste derrame de informações procurando comprometer a Policia Federal coincide também com a descoberta do envolvimento de Sellinas com contrabandistas e estelionatários. Ou seja, trata-se de uma briga em que os dois lados dizem ter muito a mostrar sobre as ilegalidades do outro.

Veronezzi considera a denúncia comprometida

"Tira o pessoal de lá. Eu vou ai hoje, sento com você amanhã e esclareço o que os caras estiverem procurando", diz Celso Cipriano a Marco Antônio Veronezzi, falando de Miami (no estado americano da Flórida), durante o telefonema gravado na fita entregue por Georges Sellinas ao JORNAL DO BRASIL.

"Veja bem, se for só da policia, não vai ter problema, mas se a Receita estiver junto eu não vou ter como tirar eles de lá, entendeu?" — responde o superintendente num trecho logo adiante.

Essa fita cria dois problemas para o delegado Veronezzi. O primeiro é o pedido de favorecimento ilegal e o segundo, o fato de alguém ter grampeado telefone de seu próprio gabinete. Entrevistado sobre as duas questões na semana passada, depois de ter ouvido integralmente a conversa gravada e solicitado a fita para instaurar um inquérito, Veronezzi explicou que só atendeu ao telefonema por deferência ao ex-agente Celso e que a inexistência da gravação do segundo contato entre eles, realizado minutos depois, compromete o entendimento de toda a situação.

O superintendente afirmou não ter ordenado a retirada dos policiais da Transdata e que comunicou isso a Celso no segundo telefonema. Veronezzi disse também que não pediu investigações ou a intimação de Celso, que no telefonema se confessa contrabandista, porque isso era função do delegado que comandava a fiscalização na Transdata.

Quanto ao grampo em seu telefone, Veronezzi disse não estar preocupado, "porque aqui não se tratam questões que possam comprometer a alguém", mas garantiu que vai instaurar inquérito para investigar o problema. Segundo Sellinas, foi o delegado federal José Benedito de Oliveira Sousa quem lhe entregou a fita com a conversa grampeada.

Jornal da Tarde, 28 de Novembro de 1991

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Veronezzi defende delegado que chefiava agentes envolvidos em contrabando

Defesa1.JPG (7387 bytes) Policiais federais escondiam na chácara de Antônio de Moraes, em Cotia, aparelhos de som contrabandeados avaliados em Cr$ 45 milhões.
O superintendente regional da Polícia Federal, Marco Antônio Veronezzi, manifestou ontem sua total confiança no delegado Marcus Vinícius Deneno, que pediu afastamento da chefia de operações da Delegacia de Crimes Fazendários depois que dois de seus agentes de confiança— Marcelo Atala e Newton Martinez — foram presos em flagrante, acusados de desviar parte de um contrabando apreendido sábado passado. Deneno é o mesmo delegado que em 28 de agosto deste ano, deu voz de prisão ao motorista da CMTC, Marcos Marques, após uma discussão no trânsito. O incidente revoltou motoristas e paralisou, por seis horas, o tráfego no Centro da cidade. "O Dr. Deneno pediu o desligamento exatamente para garantir transparência na apuração", afirmou Veronezzi. Os nomes de Deneno e do delegado Antônio Manuel Costa são citados em depoimento oficial dado pelos delegados-corregedores do Estado Adhemar Pinheiro Brizola e Luiz Rebello. Eles dizem ter ouvido do contrabandista Antônio Luiz de Moraes. que o lote de equipamentos pertencia "à Polícia Federal, ao Dr. Deneno e ao Dr. Costa". Na chácara de Antônio de Moraes, em Cotia, foram encontrados aparelhos de som contrabandeados avaliados em Cr$ 45 milhões.

"O objetivo dessa denúncia infundada ainda será descoberto", diz Veronezzi. "Quem não conhece o Costa e o Deneno? O Brasil inteiro sabe quem são eles. São os delegados que mais perturbaram o meio financeiro, os doleiros, o contrabando e os donos dos caros importados irregularmente."

Enquanto o inquérito e o processo disciplinar são conduzidos pelos delegados Luiz Carlos Zubicov e Iracema Lorite, os delegados Deneno e Costa permanecem na Delegacia de Crimes Fazendários, mas sem função operacional. Deneno e Costa não querem falar com a imprensa — o superintendente regional não os autorizou a dar entrevistas. "Acho muito estranho que um contrabandista tenha feito essa denúncia. Fica evidente que ele procura tentar atingir nosso pessoal", afirma Veronezzi. Na sede da PF, Centro, muitos policiais não escondem a irritação com a denúncia.

Condenação

O ex-delegado da Polícia Federal Joaquim Trolezi Veiga foi condenado ontem, pelo juiz da 2a Vara Federal, Otávio Peixoto Júnior, a cinco anos e quatro meses de reclusão por crime de associação com traficantes de drogas. O policial dava cobertura a uma quadrilha internacional.

A participação de Trolezi Veiga foi descoberta em março de 1987, quando a polícia encontrou um laboratório de processamento de cocaína num sítio de Itapecirica da Serra. A droga processada ali vinha do Mato Grosso e era remetida aos Estados Unidos em voos da Pan Am que partiam do Rio.

Trolezi Veiga terá o benefício de apelar em liberdade ao Tribunal Regional Federal. Sete integrantes da quadrilha, condenados, receberam mandados de prisão.

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